Fichamento 10 (FINALMENTE!) - adorei esse artigo e recomendo: http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?pid=S1676-10492007000100002&script=sci_arttext&tlng=pt#enda
WUO,A.S.A construção social da Síndrome de Down.Cad. psicopedag. v.6 n.11 São Paulo 2007
O surgimento da medicina moderna dá-se a partir das últimas décadas do século XVIII, na Europa, quando o pensamento científico começa a se desvencilhar do pensamento religioso (Foucault, 1997).
Como meio de se adaptar ao novo contexto, as causas e explicações das doenças (e das deficiências) serão agora dadas segundo fatos empíricos, distanciando-se, dessa forma, das concepções religiosas e subjetivas de eras anteriores.
Por essa época, uma das primeiras definições e causas da deficiência mental poderá ser encontrada na terceira edição da Enciclopédia (1779) de Diderot e D'Alembert, no verbete Crétin, em que se atribui à localização geográfica e questões climáticas as causas do “cretinismo” :
“ (...) dá-se esse nome a uma espécie de homens que nascem no Valais em grandíssima quantidade, e sobretudo em Sion, sua capital. Eles são surdos, mudos, imbecis, quase insensíveis aos golpes e têm bócios pendentes, até a cintura, muito boas pessoas, aliás; elas são incapazes de idéias e não têm senão um tipo de atração muito violenta por suas necessidades. Abandonam-se aos prazeres sensuais de toda espécie e sua imbecilidade lhes impede de ver nisso qualquer crime. É difícil explicar a causa e o efeito da cretinice. A sujeira, a educação, o calor excessivo dos vales,as águas, os próprios bócios, são comuns a todas as crianças dessas populações. Contudo nem todos eles nascem cretinos ... “ (Diderot e D'Alembert apud Pessotti, 1984, p.69).
A "doença" caracterizada por Langdom Down, foi nomeada, em sua homenagem, "Síndrome de Down".
No século XIX, o conceito de raça em seu sentido biológico, utilizado para classificar as diversas espécies, tomou um sentido social como forma de explicar, justificar e legitimar, com base na medicina, a desigualdade entre os homens.Conceitos, modelos e idéias são re-elaborados, tomando novos sentidos - "velhos nomes com novos significados" (Shwarcz, 1993, p. 242). A autora comenta:
“A noção de "perfectibilidade", por exemplo, do modelo do século XVIII só conservou o nome, tendo sido destituída de seu conteúdo original. Não se falava mais da concepção humanista de Rousseau, que entendia tal conceito como característica intrínseca a todo e qualquer homem, que carregava consigo a possibilidade de superar-se sempre. Na leitura do século XIX, e em especial no Brasil, a perfectibilidade seria um atributo de poucos, um sinal da superioridade de alguns grupos em detrimento de outros ...”
Segundo Brunoni (2003), a SD é uma cromossopatia, ou seja, uma síndrome4 "cujo quadro clínico global deve ser explicado por um desequilíbrio na constituição cromossômica", no caso, a presença de um cromossomo extra no par 21, caracterizando a trissomia do 21.
Há três tipos de trissomia do 21(SD): A trissomia simples, resultado da não-disjunção cromossômica do par 21 que ocorre no momento de divisão celular5 , representando 95% dos casos; o mosaicismo (2% dos casos), que compromete apenas parte das células, ou seja, algumas células possuem 46 cromossomos e outras, 47; e a translocação, também pouco expressiva, ocorrendo em cerca de 2% dos casos, em que o cromossomo extra do par 21 fica "grudado" em outro cromossomo e, embora o indivíduo tenha 46 cromossomos, ele é portador da Síndrome de Down.
As discussões a respeito das definições propostas pela ICIDH têm tido larga repercussão no âmbito internacional, como é o caso de Atkinson (1996), que discutiu as mudanças na terminologia, apontando que as trocas de palavras poderiam auxiliar nas mudanças de perspectivas e sugerir linhas de direção para que tais modificações pudessem ocorrer (Amiralian et al., 2000). O autor sugere, por exemplo, o uso de preposições na nomeação, como meio de impedir a caracterização da pessoa por sua deficiência. Assim, ao dizermos pessoa com deficiência mental em vez de "deficiente mental", retiramos do indivíduo sua condição "deficiente", dando-lhe, de certa forma, mais "chances de vida". Rieser (1995), um dos representantes da crítica ao modelo médico da doença, chama a atenção para o quanto ele se encontra atrelado aos estereótipos e à figura do médico no que tange ao estabelecimento dos processos de reabilitação, sugerindo que se adote o modelo social como central. Ao considerar esse modelo, Rieser propõe que se fique atento às barreiras sociais que não estão, necessariamente, relacionadas à deficiência, mas a preconceitos, estereótipos e discriminações.
De acordo com Mantoan (1998), esta classificação é um meio de importantes transformações no plano de serviços, pois
“(...) propõe que se abandonem os graus de comprometimento intelectual, pela graduação de medidas de apoio necessárias às pessoas com déficit cognitivo e destaca o processo interativo entre as limitações funcionais próprias dos indivíduos e as possibilidades adaptativas que lhes são disponíveis em seus ambientes de vida.”
A partir desta definição, Amaral (1998) propõe que se pense a deficiência como um fenômeno global que se manifesta em dois subfenômenos: a deficiência primária (deficiência e incapacidade) e a deficiência secundária(desvantagem). A primeira refere-se aos fatores intrínsecos da deficiência, enquanto a segunda, aos fatores extrínsecos, diretamente relacionados às barreiras atitudinais. A autora afirma (1999, p. 25):
“ Tenho, na companhia de vários de autores, argumentado que a deficiência primária pode impedir ritmos e formas usuais de desenvolvimento, mas não a sua ocorrência - o que de fato vem a suceder, muitas vezes, em decorrência das variáveis envolvidas na problemática da "desvantagem" (deficiência secundária). “
Conclui-se que dTe acordo com Meleiro (1999), o desenvolvimento de uma pessoa com SD, a exemplo de qualquer outra pessoa, deve ser considerado em seus aspectos cognitivos, afetivos, lingüísticos e motores, uma vez que cada um desses aspectos, em conjunto com a família, a escola e o entorno social, se inter-relacionam e se constituem mutuamente. O modo como a pessoa com SD é concebida pelos outros pode implicar, portanto, ganhos ou prejuízos para o seu desenvolvimento social, afetivo, cognitivo e lingüístico, pois estes são socialmente construídos. A pessoa com SD é, como nos aponta o autor, "mucho más que su carga genética, es un organismo que funciona como un todo y la genética es sólo una posibilidad" (p.33), ou seja, são as determinações sociais, e não somente as biológicas ou genéticas que irão lhes permitir o desenvolvimento e, conseqüentemente, sua constituição enquanto sujeito.
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